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29 de jun. de 2008

Amantes da Aldeia


Eles tinham cabelos brancos
do amor que dói e não passa
e a lembrança dos encontros
por entre os jardins da praça...

Fecundavam-se entre beijos
e entre abraços numa dança
encobrindo entre os desejos
velhos segredos da infância...

Eram como almas agrestes
das aves férteis de outonos...
E se amavam nos ciprestes
dos silvestres cinamomos...

Ah!... os amantes da aldeia
são de quando o amor doía...
E quando morria um deles,
ah, o outro também morria...

(A. Estebanez)




NUMEROSO AMOR



Ah, numeroso amor de que padeço
que me conta mistérios sobre mim...
Ô, enigma! princípio sem começo
destino que termina e não tem fim...

Amor que apraz e dói! amor avesso
que assim se exaure e se refaz assim
morrendo de viver por quem mereço
na volúpia de crer que é amor afim...

Flor de lótus de deuses consagrados
nos desígnios dos bem-aventurados
de alma pronta na vida já completa.

É deusa quem me dá o dom divino
de confirmar nas cartas do destino
o carisma do amor que me liberta...

A. Estebanez
(Soneto dedicado Maria Madalena Schuck, mestra responsável pela divulgação de minha poesia no sul do país)

Amor ao vinho de rosas


Esta noite
tu me permitirás ajardinar teu corpo
nos mais esconsos roseirais de amor
em bosques sublimados no conforto
de aviar espinhos sem ferir-te a flor...

Esta noite
procriarei em teus fecundos ninhos
de aves marinhas de plantão no céu...
Ah, rosa ausente dos cruéis espinhos!
Vinho de rosas com sabor de mel...

Esta noite
tomar-te-ei o amor que me suaviza
a alma sem nenhum ressentimento...
Verei teu corpo com o olhar da brisa
e o tocarei só com as mãos do vento...

Mas esta noite
quero-te o gozo múltiplo e esvaído
como as últimas lágrimas sem dor...
Só a dor de um calvário consumido
no inexorável instante desse amor!

(A. Estebanez)

UM SONETO NATALINO


Se se tem que ser hoje aquilo tudo
que em vida não se foi, podendo ser,
seja esse sonho mudo ainda mais mudo
enquanto for eterno até morrer...

Se se tem que pedir, que sobretudo
seja a doce ilusão de merecer
ao menos a esperança como escudo
de que sonha algum dia receber.

Se se tem que ser hoje aquilo tudo
que em vida não se foi, podendo ser,
seja esse sonho mudo ainda mais mudo
enquanto for eterno até morrer...

Se se tem que pedir, que sobretudo
seja a doce ilusão de merecer
ao menos a esperança como escudo
de que sonha algum dia receber.

Peça-se amor que mais amor reclame,
prazer de desejar só dor menor
em sofrer o prazer que se viveu...

Senão com grande amor não se desame
ou se ame com amor ainda maior
essa dor que tão grande se doeu!


Afonso Estebanez

Alma partida


Eu tenho a alma partida
por duendes da loucura
por causa da despedida
entre o amor e a ternura...

Loucura de amor jurado
pela jura não cumprida
do lado compromissado
da ternura prometida...

De súbito foi o instante
em que tudo se perdeu...
Mas era tempo bastante
de viver o que morreu...

E tudo o que era presente
foi tempo tão esquecido
que a ternura impaciente
não viveu o amor perdido...

E assim a alma partida
por duendes da loucura
ser causa da despedida
entre o amor e a ternura...

(A. Estebanez)

A mensagem



Desliza um pingo de chuvana
folha do pessegueiro...
Na maré do olhar vazante
o horizonte mensageiro...
Descendo a encosta do monte
o cavalo e o cavaleiro.

Um arcanjo a toda a brida
ou um raio perdigueiro...
Rumor de brisa nas águas
o cavalo e o cavaleiro...
O vento em plena algazarra
liberto do cativeiro.

Escorrem pela planície
o cavalo e o cavaleiro
transpondo portal adentro
soergue o punhal guerreiro...
Serpentes relampejando
nos olhos do cavaleiro...

Desliza um pingo de sangue
na folha do pessegueiro...
Na maré do olhar vazante
o horizonte traiçoeiro...
E a noite devora o monte
o cavalo e o cavaleiro...

(A. Estebanez)

Menina & Mulher



É algo de mulher que me fascina
nesse teu jeito etéreo de me amar
como nuvem que a lua descortina
no corpo dos lençóis entre o luar...

É algo de mulher que me alucina
perene amor que mata sem matar
uma parte mulher e outra menina
ditoso amor de meu eclipse lunar...

É algo que me encanta de tal jeito
e sangra sem doer dentro do peito
e alegra-se do sim na dor do não...

E me ama no regresso do menino
homem feito na linha do destino
já transcrito a punhal no coração...

(A. Estebanez )

28 de jun. de 2008

Um poema escrito no chão

(Ou soneto dos quinze anos)

Nos reveses desta vida
o amor não sofre senão
quando a alma é ferida
nos espinhos da paixão.

A desculpa concedida
no revés da ingratidão
arrefece a dor sofrida
no perfume do perdão.

Vê o vôo nas planuras
do orgulho nas alturas
que inebria o coração...

Deus que deu à alma

das rosas o luzir das cores
também deu por abundância

o perfume às flores
que rastejam pelo chão...

(A. Estebanez)

Soneto do perdão




(Homenagem a J. G. de Araújo Jorge)


Perdoa-me por ter-te amado tanto
e a ponto de perder-me de paixão...
Perdoa-me ter padecido o quanto
mereceu padecer meu coração...

Perdoa-me ao menos por enquanto
até que em mim pereça essa ilusão
de morrer docemente pelo encanto
de viver sepultado em teu perdão...

Perdoa se te amei tão loucamente
com tanto amor e tão perdidamente
contente em desfazer o que não fiz...

Perdoa-me também e eternamente
pelo sonho que a vida te consente
e deixa-me pensar que fui feliz...


(A. Estebanez)

Uma canção para Mathëus


Tu vens do amor divino que te espelha
num concerto de cânticos que acalma
meus inquietos crepúsculos de estrelas
que adormeceram na constelação
da alma...

Vens do anjo mensageiro que me avisa
– o senhor ancestral de meu segredo –
que teu ser múltiplo me traz na brisa
o sangue em que percorres meu amor
sem medo...

Sabes de mim como do mar o vento
como sabe os destinos o horizonte
do barqueiro... De meu contentamento
de ser ilha onde sonha o meu infante
marinheiro...

Tu vens do lado claro de meu ser
como um sonho remido de criança...
Quantas e quantas eras me restei
vivendo por viver no itinerário

da esperança...

Mas veio da canção que não se cala
na flauta o que não fala é o que me diz
e o que me diz é feito do mais terno
amor do jeito eterno do meu lado
mais feliz...

(A. Estebanez )

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