Seja bem-vindo. Hoje é

26 de jun. de 2009

EN PASSANT...



Passando aqui só para ver o meu amor
bailando nos compassos de tua canção
tão doce que pareço o meu feliz cantor
numa ária de amor vibrando o coração

passando aqui de novo para relembrar
tantas foram as primaveras sem verão
perdidas da esperança de poder voltar
ao leito de descanso dessa compulsão

de reviver o teu amor sem sofrimento
ainda que amar te seja apenas ilusão:
passando só para falar do sentimento
e todo esse lamento de não ter razão.

Afonso Estebanez

ÁTIMO



Só com você
preciso tanto
de navegar
que tanto mar
(entre nós dois)
é um caminho
que não precisa
de chegar...

Só com você
é tão eterno
estar amando
que ser feliz
(entre nós dois)
é um momento
que sempre acaba
atrapalhando...

Se não é sonho, naufraga!
Então, estamos sonhando...

Afonso Estebanez

ENTRE GÉRBERAS E ROSAS



Nunca deixes de olhar para tua flor
com o encanto das aves retirantes
ainda que em sonho te pareça dor
a dor do olhar doído dos amantes.

A flor traz sensação de ver o amor
da gávea numerosa dos mirantes:
as flores são teus barcos ao sabor
das razões infinitas dos instantes.

Faze de ti como te cuida o artífice
que te faz renascer do apocalipse
ao plano de desconhecida esfera:

um canteiro de gérberas benditas
e os arco-íris de estradas infinitas
entre as rosas de tua primavera...

Afonso Estebanez

AMOR PROFUNDO



Não seja meu amor um mero passageiro
nesta estação de embarque de quimeras
em que a esperança espera em cativeiro
nas lembranças do encanto das esperas.

Que em nossas vidas fique o cancioneiro
com memórias do amor de quantas eras
migradas de entre as pedras ao canteiro
onde hás plantado à flor das primaveras.

Que os dias não nos passem enfadonhos
e nos deixem sonhar nossos dois sonhos
como almas gêmeas de meu travesseiro.

Provavelmente o amor venha a ser tanto
que transcenda os limites desse encanto
e seja tão eterno o quanto é verdadeiro.

Afonso Estebanez

2 de jun. de 2009

NÃO VOU DESISTIR



Eu não vou
desistir do amor
nem da paz
nem das rosas
nem dos sonhos
nem de ti
e nem Deus
vai desistir
de mim...

Mesmo assim
haverá
mais espinhos
de plantão
do que flores
no jardim...

Pois o resto
é a razão
de ser assim...


Afonso Estebanez

DESENCONTRO



Foi do esperado
Que o ter perdido
Me fez ter sido
Desesperado.

O ter perdido
Foi de viver
Do haver morrido...

O ter vivido
Foi de morrer
Do haver sonhado.

Foi do encontrado
Que o ter vivido
Me fez ter sido
Desencontrado...

Afonso Estebanez
(1983)

BENDITOS POR BENDITOS...




Benditos os que não acreditarem
em mim porque terão que acreditar
nos que estão próximos de mim...

O que seria da verdade desse amor
se não fossem as mentiras com que
dizes que me amas tanto assim?...

Cada perfume pode ser medido
segundo a capacidade de exalar
o aroma das rosas exuberantes
de um insignificante jardim...


Afonso Estebanez

PARÁBOLA DE AMOR



O que vou te confessar agora
nesta inconsútil parábola de amor
a ninguém jamais foi dito.
Nem eu sei
o que dizer daquilo que não tem memória.

É como o nascimento casual
de uma flor na relva do jardim
ou a canção inesperada de um pássaro
que canta por instinto.
Porque o destino do pássaro
é cantar,
assim como o destino da flor
e florescer...

E se o destino do que devo te dizer
é esse,
então o amor por si próprio se revelará
inexoravelmente
como o sol que entra de manhã
pela janela de minha casa.
Por isso,
peço que guardes minhas palavras
para toda a vida
como a única,
última
e decisiva chave
do teu livre convencimento.

Porque amanhã,
se eu te disser a mesma coisa
já não seria a mesma coisa,
senão aquilo que te não disse
com as mesmas palavras
que teus ouvidos já ouviram
e teu coração já sentiu...
E é tudo o que sabes das águas de um regato
que não rolam mais por onde já passaram...

As aves que bailam pelo céu
nunca traçam a mesma trajetória,
ainda que prossigam em cumprir
seu destino de voar
como silfos desenhando no infinito
um aeromapa de rotas desconhecidas.

As palavras,
pastoras dos rebanhos de minhas emoções,
jamais conduzirão suas ovelhas pela mesma trilha
onde os lobos dos sentidos
tocaiam suas presas.

Assim como a canção mais leve
que há no mais breve instante em que o cristal
se quebra,
assim minhas palavras
são como as borboletas que morrem
após seu único,
último
e efêmero ato
de amor eterno!

Põe tua última atenção em mim.
Eu quero que me ouças assim como te falo
– de braços apertados ao redor desse meu próprio
abraço,
como quem vive da alegria reinventada de viver...
Ou de braços abertos para a noite iluminada
como a aurora que precede a convenção dos pássaros
antes de o dia amanhecer...
Repara bem no que agora vou dizer:
– Minha vida foi de inventar.
A única coisa que tenho reaprendido
é ficar ancorado ao redor de tua vida
como a ave marinha que não sabe de outra ilha.

A travessia para mim foi um naufrágio
de que não guardo mais qualquer recordação.
Estar aqui é só o que me basta,
como às eras dos penedos basta a brisa que as visita.
Minha esperança não tem nenhuma inquietação.
Meus sentidos não têm um só pressentimento.
Em silêncio me deito em teu regaço
e agonizo num êxtase sem sofrimento.

E assim vou construindo a eternidade deste instante
como o náufrago que reconstrói a sua nau
dos restos que ficaram dos momentos...

Despojo-te de tuas vestes
e faço disso um ritual de paz
e não um exorcismo de memórias e ressentimentos.
Eu faço como o sol que despe sua flor na relva
pela simples razão de que há nisso
o instinto de sublimação pelo milagre renovado.
Quantas e quantas vezes tens deixado
que eu te crucifique no meu corpo
pelo simples mistério que há no amor
de imolar-se sem ter padecimento.
Quantas vezes velei para que tu dormisses
com o murmúrio do mar ao redor de sua ilha...
E era sempre meu anjo quem velava
os sonhos de nós dois enquanto tu dormias.

Jamais pedi que me dissesses o quanto te mereço
nem sei se o sol o exigiu da flor.
Emigra o pássaro e seu canto fica...
Se é passageiro vem do que padeço.
Mas se é eterno vem do nosso amor!

É por isso que peço que me escutes
pela última vez em tua vida...
– Das mais altas colinas de meu ser
das mais altas encostas já vencidas

declaro-te mulher,
rainha te consagro
e deusa te proclamo...

E meu grito ressoa nas montanhas:

– EU TE AMO!...
– EU TE AMO!...
– EU TE AMO!...


Afonso Estebanez
(1988 – Poema dedicado a Lucian R. Estebanez Stael)

E-book